Quem tem o básico de compreensão sobre feminismo e direitos das mulheres já sabe disso, mas é preciso repetir com frequência, seja por problemas identitários, seja para que as mulheres que não são feministas também entendam que o aborto sob demanda as beneficia.

O aborto é a última — e a única — solução para a gravidez indesejada, não importando o motivo que levou a mulher ou menina a engravidar. No centro da discussão estão direitos básicos das mulheres: a integridade física, autonomia corporal e soberania reprodutiva.

Quando a discussão desvia desses 3 pilares, ela passa a ser sobre outro assunto (ex.: “saúde pública”, “tempo gestacional”, “ricas abortam, pobres morrem”, “direitos do feto”, “mulheres que não querem abortar”) e nós paramos de avançar sobre o nosso direito. Mais que isso, regredimos. E nessa regressão, aquelas que têm menos condições de se defender, como mulheres sem estudo, pobres, jovens, deficientes etc., são as primeiras a perder acesso aos direitos.

O aborto não existe sob demanda no Brasil, mas ele é permitido em 3 situações: quando há risco à vida da grávida (não necessariamente iminente), anencefalia fetal e quando a grávida foi vítima de violência sexual. Isso inclui menores de 14 anos, que por definição são vítimas de estupro de vulnerável em qualquer interação sexual com maiores de idade.

É importante lembrar que o que não existe, nunca existiu, não está previsto na Constituição e nem mesmo classificado como crime, é um limite gestacional para que o aborto seja cumprido. A qualquer momento, as grávidas que se encaixam nessas 3 situações podem requerer seu direito.

Não importa o que ACHA o Conselho Federal de Medicina, seus membros podem ter a opinião que quiserem sobre este e outros assuntos. Quem assegura o direito é a Constituição, que está certamente acima da opinião de um grupo de pessoas. Quanto mais uma opinião que contraria as leis do país.

O recente ataque da Câmara dos Deputados ao direito das meninas é mais uma prova do que dizemos. Quando o assunto é desviado, quando deixa de ser integridade física, autonomia corporal e soberania reprodutiva; e se torna “aborto para meninas” (ou como gostam de dizer certos grupos, “crianças”), nós perdemos a discussão. Quando desviamos, paramos de pedir aborto sob demanda, gratuito, legal, seguro e livre, e passamos a pedir “direito de aborto para meninas”. Nós não queremos “direito de aborto para meninas”, TODAS as meninas já têm esse direito. Já está previsto. O que queremos é que ele se cumpra, e queremos que todas as mulheres tenham esse direito também. Em qualquer situação.

Por último, não tenham dúvidas: homens não engravidam, não gestam, não dão à luz e não amamentam. Quando alguém diz que “certos homens engravidam”, isso também é estratégia para tirar o foco do assunto, nos desestabilizar e atrasar nossos direitos.

O único jeito para um homem engravidar é se trocarmos o significado das palavras “mulher” e “homem”. Se mentirmos que mulheres podem ser do sexo masculino e homens podem ser do sexo feminino. Mas mentira tem perna curta, e a realidade é inflexível, não se rende às chantagens ou delírios identitários.

Manter grávida uma mulher ou menina que não quer se reproduzir e condená-la a dar à luz é tortura. E é dessa violação dos direitos humanos das mulheres que estamos tratando.

Se houvesse aborto sob demanda, meninas não teriam seus direitos revogados

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